Os limites de um professor

Mediador do conhecimento, educador, cuidador, articulador, instrutor, pesquisador, incentivador, psicólogo, terapeuta, essas são algumas das funções que nós professores acumulamos e exercemos ao longo de nossa “carreira profissional”.

Sim, é certo que nós professores somos profissionais, estudamos, nos especializamos e trabalhamos muito para que fôssemos vistos dessa forma, como profissionais da educação. Ainda assim, o que  vemos muitas vezes é uma certa romantização do trabalho pedagógico, e isso faz com que muitos pais se sintam isentos do trabalho de educar os seus filhos.

Infelizmente, há aqueles que deixam de ensinar conceitos básicos, como respeito, responsabilidade, empatia e outros valores que formam o caráter da criança e do adolescente. Pais que, mesmo estando presentes fisicamente, não se atentam a vida do filho, não veem  o que ele faz na internet, não sabem quem são seus amigos e muito menos acompanham sua vida escolar.

Dessa forma,  a  falta de acompanhamento dos pais pode resultar em vários problemas socioemocionais que já há algum tempo são observados em nossos jovens e que diante dos efeitos da  pandemia da Covid-19, foram agravados.

Os estudantes ficaram quase dois anos afastados da escola, assistindo aulas remotas ou até mesmo sem aula alguma. Houve aqueles que  ficaram sozinhos em casa, cuidando dos irmãos, outros tiveram que começar a trabalhar para ajudar no orçamento familiar.

No pós-pandemia, a escola vem enfrentando inúmeros problemas. Nós professores estamos lutando diariamente para suprir o déficit cognitivo desses alunos que não estudaram nesse período. Criamos novas estratégias, atualizamos nossas metodologias e tentamos correr atrás desse prejuízo, para que nossos alunos possam se adequar as séries em que foram inseridos.

Mas, infelizmente, o maior problema que enfrentamos hoje vai muito além da sala de aula e posso afirmar, com absoluta certeza, que a maioria das escolas, principalmente as públicas, não se prepararam adequadamente. Nossos alunos estão “adoecidos”. Depressão, ansiedade, síndrome do pânico, fobia social, são algumas doenças que estão afetando a saúde mental e o estado emocional dos nossos jovens. Muitos estão tendo dificuldades para irem à escola, ou quando vão, apresentam comportamentos violentos, apatia, tristeza profunda ou frequentes crises de choro.

Como educadores, temos nos deparado  com histórias extremamente tristes, de crianças e jovens que perderam na pandemia, seus cuidadores diretos (pais, avós, tios), ou que foram abusadas sexualmente por familiares enquanto estavam em casa. Quando detectamos algum problema em que a solução está fora de nosso alcance, tentamos a ajuda profissional, procuramos o conselho tutelar, orientamos e direcionamos a família a procurar atendimentos psicológicos. Entretanto, algumas famílias levam essas crianças para o atendimento e diagnóstico inicial, mas muitos não continuam o tratamento, pois os pais alegam não terem “tempo” para levá-los à terapia ou acham o lugar longe, de difícil acesso.

É papel do professor observar e ajudar o seu aluno no que for possível. Mas será que estamos preparados para enfrentar esses problemas socioemocionais? A resposta é não! Quais  seriam então os limites de um professor?

A verdade é que nós professores também estamos sofrendo com problemas parecidos. Diariamente convivo com colegas que estão com sequelas físicas da Covid-19, que também perderam seus familiares para a doença, ou que estão com ansiedade e depressão. A impressão que temos é que ninguém está preocupado com a saúde mental dos professores. Nos sentimos pressionados a solucionar os problemas dos estudantes e até somos orientados a fazer cursos para amenizar os problemas de saúde mental observados. No entanto, isso não é o bastante, precisamos de ajuda profissional, por meio da presença de psicólogos e terapeutas nas escolas.

Tanto a saúde mental dos estudantes, quanto a dos professores, precisam ser priorizadas nesse momento. É papel da escola formar os futuros cidadãos, que lutam por uma sociedade cada vez mais justa e, para isso, precisamos pensar em como melhorar nossas habilidades sociais.

O papel da família nesse cenário é extremamente importante, os pais precisam ser mais presentes na vida dos filhos e enxergar que sem saúde mental não chegaremos a lugar algum. E quanto a nós professores, precisamos de mais apoio, respeito e valorização por parte dos estudantes, das famílias e dos governantes. Enfim, também precisamos de “cuidados e atenção” para que possamos cuidar daqueles que são a nossa esperança de um futuro melhor.

Ludmilla Damasio Lima

Professora de Língua Portuguesa da rede pública municipal e estadual.

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