Três mil setecentos e noventa e quatro. Esse é o número de crianças disponíveis para adoção em casas de acolhimento até o mês de abril de 2022. Nesse momento, o país começa a se recuperar da queda no número de adoções durante o período de pandemia, onde muitos dos processos indispensáveis como visitas e entrevistas com a assistência social foram prejudicados. No mês em que é comemorado o Dia Nacional da Adoção, é importante olhar para a causa com mais atenção e esperança.
Enquanto temos quase 4.000 crianças disponíveis para serem adotadas, existem até o momento quase 33 mil pretendentes disponíveis. Essa conta parece não fechar, mas uma das principais razões que explica o desequilíbrio é o fato de que grande parte das crianças disponíveis para adoção possuem mais de 10 anos — aproximadamente 62% do número total.
Por outro lado, a grande maioria dos pretendentes a adotantes deixam claro suas intenções: crianças de até seis anos e preferencialmente, sem irmãos. Características difíceis de serem verificadas quando olhamos para a atual situação das casas de acolhimento espalhadas pelos estados brasileiros.
O que a lei diz?
Em geral, ao ouvirem sobre o processo de adoção no Brasil, tornou-se um senso comum a existência de processos burocráticos e a noção de que o tempo geral de demora dos processos não costuma ser previsível, já que depende de uma série de fatores variáveis, que serão avaliados pelos órgãos competentes.
Como explica o advogado Darlan Santos, especialista em Direito de Família, as etapas determinadas juridicamente são necessárias para ser assegurado que o bem-estar e a segurança da criança estarão sendo colocados em primeiro lugar.
Ele explica que entre as etapas obrigatórias estão a entrega de documentos na Vara da Infância e Juventude, a participação em curso preparatório exigido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), realização de exames de aptidão física e mental, apresentação de antecedentes criminais e comprovação de renda.
“As pessoas interessadas em adotar serão entrevistadas e passarão por uma avaliação técnica que será encaminhada a um curso de preparação psicossocial jurídico. Ali terão o entendimento do que é a adoção e das suas responsabilidades com o adotado. Com o deferimento do pedido de adoção, ocorrerá a inserção no Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento”, explica o especialista.
Entre os requisitos legais para a adoção está a idade superior a dezoito anos e a diferença mínima de dezesseis anos em relação a criança que se pretende adotar. Além disso, a lei não permite a adoção de ascendentes, como por exemplo avôs adotarem netos ou a adoção entre irmãos. Outra modalidade conhecida como “adoção à brasileira”, é enxergada como crime, na qual o adotante registra uma criança recém-nascida como filho biológico, sem passar pelos processos formais de adoção.
O olhar de uma mãe
“Dúvida eu não tinha, eu tinha medo”, lembra Raquel Jaime, que passou pelo processo de adoção do filho que hoje já está com 21 anos. Segundo ela, o medo e a angústia são sentimentos comuns de quem passa pelo processo. Quando olha para o passado, lembra-se da apreensão e instabilidade sentidas durante as fases necessárias até a oficialização da adoção. Ela conta que na época havia mais riscos de a adoção não ser concretizada, mesmo após o período de convivência familiar.
“No início do processo nós iríamos passar pela fase com assistente social e na nossa época a adoção foi feita diretamente entre nós, a mãe e o juizado da infância e juventude. Nós já o levamos para casa de imediato, depois a assistente social fez uma guarda provisória e o meu medo era de que ela mudasse de ideia”, recorda.
Raquel afirma que sempre fez questão de esclarecer quaisquer questionamentos que o filho tivesse, além de contar com apoio profissional para tornar a adaptação mais tranquila para todos os envolvidos. Para ela, o acompanhamento psicológico foi primordial, além da transparência e confiança criadas a partir do vínculo que a família trabalhou para construir. A adoção, segundo Raquel, precisa ser um esforço coletivo, na qual todas as partes estão dispostas a alcançar o mesmo fim — a construção de um lar seguro e com princípios sólidos de amor e companheirismo.
“Eu creio que precisa estar aberto para o sexo e raça que estiver disponível. Nós escolhemos aquilo que Deus tinha para nós. O nosso filho é negro e isso para mim nunca fez nenhuma diferença”, reforça a pastora. Quando fala sobre as perguntas essenciais que uma família precisa se fazer antes de dar prosseguimento com o processo de adoção, Raquel destaca que é preciso haver a real disposição do casal em receber aquela criança com amor e suporte.
“Muda tudo, né? Muda quem faz bagunça na casa, muda as coisas que antes estavam arrumadinhas em um lugar. Para mim é um filho amado do mesmo jeito. Costumo dizer para ele que é ainda mais amado do que os outros. Ele é um presente de Deus, tenho certeza de que nós não erramos, apenas somou em nossas vidas como uma grande benção”, completa emocionada.