A flecha certeira

imagem: envato

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Era um início de noite, num domingo como qualquer outro, quando muitas famílias se dirigem a um templo para os serviços religiosos a que estão habituados. Todavia, naquele domingo ele estava só. Estacionou, como de costume, próximo à entrada do templo, ajeitou o nó da gravata, pegou uma Bíblia no banco do passageiro e se dirigiu à porta do templo. Poucas pessoas estavam no local, como deu para ver esticando o olhar através da porta principal, enquanto caminhava lentamente em direção a ela.

De um lado e de outro da entrada, duas colaboradoras, senhoras de meia idade, se posicionavam para recepcionar quem chegasse. Havia algo diferente daquela vez. Uma delas, à direita, era nova na função de recepcionista e estava com a expressão um tanto quanto apreensiva. Quando ele passou por ela, sorriu e fez um aceno com a cabeça, cumprimentando-a com palavras e um levantar de sobrancelhas. Ela correspondeu parecendo tímida.  Poderia ter ficado nisso, mas ele decidiu ir além. Parou, retrocedeu uns dois passos e disse assertivamente: “A senhora está muito bonita! Parabéns pelo figurino, pelo penteado, pela maquiagem. Com todo respeito, a Senhora está deslumbrante hoje!” Ela ficou quieta, fitou-o profundamente nos olhos e agradeceu, parecendo desconcertada. No trajeto até o assento, ele chegou a pensar se não poderia ter sido mal interpretado, mas só quis ser gentil, cordial.

Uma semana depois, outro cenário. Outras pessoas à porta, um certo tumulto pelo volume de pessoas que se congregaram naquele domingo para ouvir um visitante ilustre. Enquanto se dirigia ao assento de mãos dadas com a esposa e a filha, ele sentiu alguém lhe tocar gentilmente o ombro. Quando se virou, a reconheceu imediatamente, que vinha logo atrás ao lado do que pareceu ser seu marido. Ela simplesmente se apressou em dizer: “Preciso muito falar com você, em particular, após a celebração. Por favor, não vá embora sem falar comigo, é muito importante!”  Um frio lhe percorreu a espinha. Meu Deus, meu temor era real, pensou consigo. Por um tempo ficou a remoer aquilo na mente. Em tempos de tantas denúncias de assédio, de maridos desacompanhados das esposas em eventos e propensos a gracejos inoportunos, aquela “intimação” para uma conversa lhe era, no mínimo, preocupante!

Eles se encontraram na saída, mais precisamente na antessala da secretaria, onde ela o aguardava. Foram poucas as suas palavras, mas refletiram o desabafo de um coração aflito, mas, parecendo aliviado. “No domingo passado” – começou ela, “eu estava emocionalmente devastada. Havia muitos dias em que eu questionava a razão da minha existência e pensei muitas vezes que seria melhor morrer. Me sentia inútil, invisível, rejeitada e sem importância alguma. Em oração, tomei coragem e fiz uma prova com Deus. Liguei para a Igreja e pedi para ficar à porta, recepcionando as pessoas, embora nem fosse escalada para tal função. Eu disse: Senhor, eu vou me arrumar como se fosse a uma festa. Vou te provar que ninguém vai me perceber, todos serão indiferentes. Fui ao salão, dei um trato no cabelo e na pele, escolhi uma vestimenta elegante, em perfumei e fiquei ali. Quando você me percebeu e me elogiou, eu fiquei completamente sem reação, mas profundamente feliz. Você não faz ideia do que o seu elogio fez na minha mente, no meu coração. Nem mesmo meu marido havia feito qualquer comentário sobre minha aparência, sequer minhas amigas repararam meu novo corte de cabelo. Foi ali, na porta do templo, que o milagre aconteceu! No lugar aonde as pessoas vão para ouvir a voz de Deus, seu elogio penetrou como um raio, uma flecha alcançando o alvo, como a própria voz do Senhor! Muito obrigado por ter me percebido… Foi uma oração secreta, íntima e pessoal, um ousado desafio de uma criatura para seu criador! Hoje, depois de refletir bastante e sentir uma imensa paz na alma, eu tenho certeza não apenas que Deus existe e ouve as orações sinceras, mas que, acima de tudo, demonstrou se importa comigo. Foi o único elogio que recebi, para que não restasse dúvidas! Deus te abençoe pela gentileza, mas não foi bem a sua voz que eu ouvi!

Ele sentiu um misto de alívio e alegria. Foi um abraço respeitoso e acolhedor. Ele foi para casa refletindo: é verdade que, se uma palavra pode mover uma montanha, um simples elogio sincero pode provocar uma grande revolução!

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Simone Macedo
Simone Macedo
15 dias atrás

Maravilhosa estória!,

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