O dia 11 de julho de 2017 ficará marcado como a data em que o Senado aprovou a lei ordinária 13.467/17, da Reforma Trabalhista, mesmo sob forte reação de vários segmentos do mundo do trabalho e da sociedade, contra a forma e grande parte de seu conteúdo de exclusão e redução de direitos trabalhistas e sociais conquistados há quase 75 anos através da Consolidação das Leis do Trabalho, a CLT e elevados ao nível constitucional pela Constituição Federal de 1988 há 26 anos.
A aprovação da lei da reforma se deu em meio a grave crise política e econômica no Brasil. O índice de aprovação do Governo Federal era a época 6% e com diversos integrantes do parlamento brasileiro e do Poder Executivo denunciados em inquéritos e no Supremo Tribunal Federal.
A Organização Internacional do Trabalho, a OIT, que agrega mais de 170 países do mundo, em Convenção aprovada e ratificada pelo Brasil estabelece que as alterações legislativas de alcance social como as do mundo do trabalho precisam ser antecedidas de ampla discussão com a sociedade, preceito esse que não foi observado, gerando pronunciamento da OIT em resposta à consulta do Ministério Público do Trabalho.
O apressado e atabalhoado processo de alteração legislativa da Reforma Trabalhista ocorreu sem se observar os princípios democráticos e sem proceder a uma ampla discussão. O início se deu em 23 de dezembro de 2016, vindo depois o recesso legislativo, que só retoma na prática no mês de março, e em meados de julho já ocorreu a aprovação no Senado e a promulgação pelo Governo, enquanto a tradição brasileira para mudanças de leis é bem diferente. O Código de Processo Civil de 2015 foi discutido durante 5 anos com a sociedade e O Código Civil de 2002, por mais de 20 anos.
Os vários setores da sociedade que se opuseram à reforma trabalhista foram em algumas oportunidades convidados para audiências públicas e eventos sobre a Reforma Trabalhista, mas não foram ouvidos ou levados em conta nos relatórios da Comissão Especial da Câmara ou do Senado da República.
Entre os órgãos e entidades da sociedade civil, que se opuseram fundamentadamente à Reforma Trabalhista podem ser enumerados, dentre outros: a Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (ABRAT); o Ministério Público do Trabalho (MPT); a Associação Nacional dos Magistrados Trabalhistas (ANAMATRA), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB); a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT); o Colégio de Presidentes e Corregedores da Justiça do Trabalho (COLEPRECOR); Ministros do Tribunal Superior do Trabalho, o TST, em sua maioria.
É importante que seja esclarecido em que contexto de Brasil se dá esse processo de Reforma Trabalhista, que estabelece diversas formas de contratos precários como o intermitente e o autônomo exclusivo, além de permitir jornada de trabalho de até doze horas por dia e redução do intervalo para repouso e alimentação, em até trinta minutos.
O Brasil tem em seu histórico 388 anos de escravidão e apenas 130 de trabalho livre. Apesar de ser a 7ª Economia do mundo é o 75º do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano). Dos mais de 90 milhões de pessoas empregadas no país, 71,9% recebem até 2 salários mínimos, de acordo com pesquisa do PNAD/IBGE. Micro e pequenas empresas oferecem 52% de todos os empregos, conforme dados do Sebrae.
O país tem 3 milhões de crianças e adolescentes em condições de exploração de trabalho infantil e em torno de 170 mil trabalhadores em condições análogas a de escravos, além de ser o 4º país do mundo em acidentes do trabalho.
Diversas modificações trazidas com a reforma trabalhista excluem, reduzem e precarizam direitos trabalhistas assegurados há mais de 75 anos pela CLT, que é o conjunto de normas que asseguram direitos e garantias mínimas nas relações de trabalho no Brasil.
As alterações aprovadas na lei da reforma trabalhista promovem redução de direitos que foram experimentados por países como Inglaterra, Portugal, Espanha, Itália e México, sem atingir os objetivos traçados por seus defensores, principalmente o de que a redução de direitos irá gerar mais empregos, acreditando que as empresas ficarão estimuladas a oferecer mais empregos, o que na prática não ocorre. O que aconteceu em outros países que implantaram reformas semelhantes é o empobrecimento da classe trabalhadora, com a exclusão e a redução de direitos mínimos elementares dos trabalhadores.
A precarização das condições de trabalho implementada pela reforma em análise contrasta com o compromisso brasileiro assumido pelo Governo Federal em 2003 perante a Organização Internacional do Trabalho (OIT) para consolidar as diretrizes e desenvolver ações para implementação de uma Agenda Nacional de Trabalho Decente, cuja definição consiste num “trabalho adequadamente remunerado, exercido em condições de liberdade, equidade e segurança, capaz de garantir uma vida digna”.
A Lei nº 13.467/2017 inclui uma série de restrições à garantia constitucional de acesso à justiça para os trabalhadores, dificulta a execução processual e reduz a responsabilidade civil das empresas contratantes. Amplia de várias maneiras as facilidades de defesa para o empregador e dificulta a produção de provas para o trabalhador, ampliando ainda mais o desequilíbrio entre o capital e o trabalho.
A Reforma Trabalhista em seu conjunto normativo contraria as garantias da Constituição Federal e de Normas Internacionais de proteção do trabalho e da pessoa humana do trabalhador, além de dificultar o acesso à Justiça, criando obstáculos como o pagamento de custas, honorários periciais e advocatícios pelo trabalhador, além de limitar o instituto da justiça gratuita para a população trabalhadora menos favorecida financeiramente. Esses impedimentos contrariam o amplo direito de ação garantido na Constituição Federal. Foi nesse sentido, que o Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, interpôs no Supremo Tribunal Federal, Ação Direta de Inconstitucionalidade, na defesa da população trabalhadora que não tem condições de arcar com o pagamento de custas e demais despesas com a ação trabalhista.
De outra parte, não consideramos verdadeira a afirmação de que a Reforma Trabalhista veio para modernizar as relações de trabalho, nem para trazer segurança jurídica a empregados e empregadores, fortalecer a economia, gerar empregos para os quase 14 milhões de desempregados do nosso país. Ao contrário, a Reforma Trabalhista reduz o papel da Justiça do Trabalho e enfraquece a representação sindical dos trabalhadores.
É preciso ainda salientar que o que gera empregos é o crescimento econômico e uma ampla reforma tributária, que sequer está sendo cogitada nesse momento da política brasileira. Na última década pudemos experimentar períodos de crescimento econômico e de quase pleno emprego. É nesse cenário que ocorre a geração de empregos e os trabalhadores e as classes sociais menos favorecidas tem o poder de compra ampliado, a indústria e o comércio são fortalecidos e toda a sociedade ganha com crescimento econômico.
O nosso país precisa de investimentos em educação, cultura, formação e aperfeiçoamento profissionais para aumentar a produtividade do trabalho e da sua qualificação. É preciso um esforço conjunto do Estado, do Governo, da Sociedade Civil e de todos os cidadãos para reduzir a desigualdade no Brasil e para a construção conjunta de uma sociedade mais justa, humana e igualitária.