Sol a pino. Nada mais refrescante do que um copo de alumínio quase transbordando de água fresca da moringa escondida estrategicamente debaixo das telhas de barro no canto do lote, perto da moita de capim cidreira. Depois de tirar o boné azul estampando o logotipo da loja de material de construção, o pedreiro escalado para o dia, desliza as costas da mão direita pela testa para secar o suor intenso. Um olhar ligeiro para a masseira o faz lembrar que a argamassa pronta não pode esperar. O boné volta ao topo da cabeça, cobrindo os cabelos desalinhados e amassados. Uma esticada de braço, e a colher de pedreiro está novamente à baila, cortando a massa e forrando a fiada de tijolos para a próxima sequência. O radinho de pilhas perto da marmita vazia faz ecoar uma música ligeira no acordeom, estridente que só, num som chiado e sem qualidade. Tentar acompanhar a música com assovios é um desafio, mas acertar o nível da nova carreira de tijolos sem usar o prumo é um desafio muito mais interessante.
Pausa para o cafezinho. Tudo bem se já estiver morno no meio da tarde, quando sorvido em poucos goles na própria tampa da garrafa térmica, melhor que não ter. “Como estarão as coisas lá em casa?”, pensa num lampejo. Os meninos estão na escola e a patroa certamente está ajoelhada no cimento vermelho, espalhando a cera e cantarolando aquele hino que aprendeu no último culto, satisfeita por ter um lar e uma família para cuidar. O sol declina devagar. Um dia de serviço quase completo, só falta amontoar as tábuas junto dos cavaletes, lavar as ferramentas, recolher a moringa, a marmita e a garrafa térmica, trancar o pesado portão de ferro, se ajeitar na bicicleta e voltar para casa satisfeito. No caminho de volta, um pensamento de gratidão lhe toma de sobressalto. Graças a Deus pelo alicerce pronto, pelas paredes já pela metade, pelas vigas de concreto nos devidos lugares, pela casa tomando forma com os vão das janelas e portas delimitando os futuros cômodos, pelo contrapiso de concreto bem curado. A imagem da casa pronta parece um sonho. Que satisfação ver quanta coisa já foi feita!
Dia seguinte, outro pedreiro, sol escaldante, trabalho duro. Achei que chegaria a madrugada, mas não chegaria cinco da tarde, resmunga o sujeito, raspando a sola da botina num disco de arado fincado num canto, pra retirar a lama grudada. Volta pra casa, pensamentos recorrentes. Ainda falta tanta coisa, sussurra para si mesmo enquanto empurra a bicicleta na subida. Falta terminar as paredes, cobrir, rebocar, fazer todas as instalações, colocar o piso, pintar… “Meu Deus, nem consigo imaginar esta obra pronta, se é que acaba um dia”, reclama.
A mesma obra, os mesmos esforços, o mesmo preço, o mesmo tempo.
Dois olhares distintos sobre a mesma coisa. Talvez isto nos ensine que precisamos decidir como avaliar os nossos esforços em nossas construções pessoais. Se com gratidão pelo que já temos e fizemos ou se com murmuração pelo que ainda nos falta conquistar.
O que tornará nossa jornada mais feliz? Como será sobre nós o olhar d´Aquele que provê todos os recursos de que precisamos? A nossa maneira de ler e interpretar as situações irá revelar o nosso coração, mas também pode nos ensinar muito sobre louvor, sobre ansiedade, sobre gratidão e sobre como lidamos com nossas expectativas!