Um só corpo e um só Espírito

“Há um só corpo e um só Espírito, assim como a esperança para a qual vocês foram chamados é uma só; há um só Senhor, uma só fé, um só batismo, um só Deus e Pai de todos, que é sobre todos, por meio de todos e em todos”. (Efésios 4:3-6).

Desde pequena costumava personificar as coisas, dizeres e principalmente versículos bíblicos. Hoje ainda tenho esse costume. Sempre que leio Efésios 4:4 imagino os irmãos na igreja abraçados, chorando, ao som de: “somos corpo e assim bem ajustado, totalmente ligados, unidos, vivendo em amor…”

Saudade dos tempos das vigílias e dos caldos que as irmãs faziam pra turma que ficava até o amanhecer. Saudade das caronas que as famílias davam e lotavam o carro para não deixar a moça de família sozinha (e não ter a desculpa de ir acompanhada do rapaz, vigia sô!). Saudade das reuniões de oração ao som do violão de três acordes, onde o Espírito Santo era palpável. Das serenatas de aniversário e dos acampamentos exaustivos para o corpo, mas revigorante para a alma.

Infelizmente, o fato é que temos o instinto de andarmos e agirmos sós. Com o passar das décadas, o individualismo se tornou cada vez mais real. As reuniões de oração estão mais extintas, as moças vão para casa em seus próprios carros, as vigílias reduziram seus horários (inclusive pela violência das grandes cidades), as serenatas viraram emoji no App, o violão de três acordes foi deixado pela tecnologia e a conferência online tornou tudo mais fácil.

O distanciamento espontâneo se estabeleceu cada vez mais real em nossas vidas, pessoas que não vão mais aos cultos, famílias desfeitas e relacionamentos rompidos. E para completar essa situação, em meio a esse esfriamento e indiferença, surgiu um vírus que causou o distanciamento obrigatório entre as pessoas.

No início, os mais humorados postavam suas casas arrumadas, pés para cima em tom de férias e descanso, alguns animados para assistirem o culto online, cheios de expectativas para tirarem esse tempo e colocar algumas coisas em ordem. A vida online e isolada também trouxe algum benefício: a reflexão.

Os dias se passaram, as férias não foram exatamente como pensado, o estresse da vida home office começou a fazer efeito. De um lado, os filhos tentando se adaptar as aulas pela internet, presos sem poderem brincar, do outro lado, o cônjuge desesperado com as contas para pagar.

O mais interessante de tudo isso é ver em muitos a saudade de ser corpo, “assim bem ajustado totalmente ligado, unido, vivendo em amor”. Nunca se teve tanta saudade de ser um só corpo, um só espírito, ouvir o violão de três acordes… E o silêncio do vazio começa a gritar de saudade dentro da alma pela metade que nos foi tirada. Ser corpo ao menos para ter a oportunidade de ir ao culto presencial, abraçar o restante dos membros ou para dar carona pra moça de família mais uma vez!

Quebrou-se os corações, a dor na pele e no bolso se tornou real. Quando nos vimos em situação difícil, pensar que em “um só corpo” tudo ficava mais fácil, em um só espírito o peso ficava mais leve, entende-se melhor Filipenses 4:4. Não é quando as coisas estão em perfeita harmonia que esse versículo faz sentido, é em meio caos, ao saber que a realidade do irmão é pior do que a nossa.

Não há como ser corpo em casa, mesmo com sua família. Os dedos precisam das mãos, que precisam dos braços, que precisam do tronco, que precisam das pernas, que precisam dos pés, que precisam dos dedos maiores e que precisam dos dedinhos.

Em meio a esse caos, ser um só corpo é receber ou enviar uma mensagem: “está precisando de algo? Está tudo bem por aí? Conte comigo”. Chegar inesperadamente na casa do seu irmão e lhe entregar uma oferta ou um abraço. Escrever aquela carta quando o vê chorando, e orar por ele(a) em todos os momentos. Entender que, sendo um corpo, jamais seremos o mesmo se um membro for tirado, mesmo que seja o dedinho do pé.

Hoje, mais do que nunca, personifico o dia de voltar a abraçar, de cantar coladinho e não só cantar, olhar nos olhos, chorar e declarar: “somos corpo…”.

Sonho com o dia de pegar no pé do irmão, chegar mais cedo aos cultos, saber se está tudo bem, sentir o cheiro de caldo da cantina, passar na livraria e tomar aquele café e ver se tem livro em promoção, olhar pra minha igreja, tão linda de novo, respirar fundo e viver um só espírito, em um só corpo!

Armanda Paz

Cantora e Professora de canto. Ministra de Louvor na Igreja Batista Renascer Sede. Instagram: @armandapaz

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