Família na Era Digital

Todos nós sabíamos que a Era Digital chegaria algum dia.

Lembro-me de assistir o desenho “Os Jetsons” e ficar espantada com a robô Rose. Imaginávamos que essa “modernidade” chegaria algum dia, mas o que acho que ninguém imaginava é que chegaria tão rápido. A verdade é que nos últimos três anos, a tecnologia ocupou um espaço ainda maior, e hoje vemos que do “mamando a caducando”, todos estão em contato com esse mundo virtual.

Tudo que nos rodeia hoje é virtual: o banco é totalmente digital, as consultas médicas podem ser realizadas de forma on-line, receitas são digitais, conversas com familiares pelo FaceTime, compras de supermercado pelo site que chegam na sua casa, audiências judiciais, e até mesmo as nossas igrejas precisaram se adaptar. Não é de nos surpreender que essa era, que entra de tantas maneiras em nossa casa, atingisse também a nossa família.

Por outro lado, também não podemos negar os benefícios e as facilidades que as tecnologias nos trouxeram. Quem lembra das horas que passávamos nas filas dos bancos, por exemplo? Sei que muitos ainda não aderiram, mas para mim, as compras de supermercado têm sido uma revolução. Faço rapidamente pelo aplicativo e elas chegam na minha casa, ganho algo em torno de 3 horas por semana. Mas, e o efeito dessa facilidade na família e na igreja?

O ser humano tem necessidade de se relacionar, de abraçar, de ser ouvido e ser tocado. Quando substituímos por exemplo o culto presencial pelo culto virtual, podemos até ouvir a mensagem, mas perdemos a comunhão e o efeito terapêutico do abraço.

Quando olhamos para o núcleo familiar as consequências são ainda mais trágicas. Hoje temos visto pais e filhos se perdendo dentro de casa. Como pediatra, vejo frequentemente mães que perdem a oportunidade de conversar, orar e admirar seus bebês enquanto os amamenta para poder anotar no aplicativo o tempo da mamada, qual seio foi o “da vez”.

À medida que esse bebê cresce, os pais têm perdido o olho no olho, pois muitas vezes seus filhos estão contando algo e eles estão respondendo “só mais uma mensagem”. Nas apresentações da escola perdem o todo para enxergar apenas o que a tela do celular mostra, pois precisam filmá-los para postar em alguma rede social exibindo seus filhos como se fossem troféus.

Além disso, as crianças têm ficado horas nas telas para dar um pouco de descanso aos pais, afinal, responder inúmeras perguntas por minuto, correr atrás de menino que está aprendendo a andar e quer explorar o mundo é muito exaustivo. Então, coloca-se uma tela e a criança fica como se estivesse hipnotizada, mas sentada, sem conversar e atrapalhar.

É lamentável, pois a conta de tudo isso tem chegado cada dia mais cedo. Inúmeros bebês com atraso na fala, atraso no desenvolvimento cognitivo e, a médio prazo, prejuízo no desenvolvimento social e emocional.

O sedentarismo e a obesidade também têm tomado conta dos nossos adolescentes e como era de se esperar, cada dia mais cedo as crianças e adolescentes apresentam crises de ansiedade, pânico e depressão. Temos observado um número alarmante de suicídio na faixa pediátrica.

O acesso as redes sociais, além do prejuízo causado pela exposição a conteúdo impróprio para idade, como violência e pornografia, têm trazido uma distorção da realidade e não aceitação do próprio corpo, o que tem levado adolescentes ao desenvolvimento de distúrbios alimentares.

A lista de prejuízos não para por aí: além dos prejuízos emocionais e psiquiátricos, é possível observar problemas de déficit de aprendizado, alteração no sono e até deficiências de vitaminas pela baixa exposição ao sol.

Sabendo que não temos como viver sem a tecnologia, surge a pergunta: como podemos fazer para minimizar os seus efeitos colaterais? Creio que essa seja a sua pergunta. Nesse texto, quero te ajudar dando dicas efetivas e possíveis para que todos possam praticar.

A primeira dica é: postergar ao máximo a entrega do celular para o seu filho. Talvez você seja motivado a dar, porque acredita que irá facilitar a sua comunicação enquanto ele estiver na escola, mas os prejuízos precisam ser colocados na balança.

Não tenha medo que seu filho seja o último da sala a ter o aparelho, na verdade, talvez esse deva ser seu objetivo. Caso ele já tenha o próprio celular, algumas regras precisam ser bem estabelecidas: horário de desligar o celular, preferencialmente duas horas antes do horário de dormir, o que vale também para adultos. Segundo pesquisas, o efeito da luz sobre o cérebro influencia negativamente o nosso sono.

Outra coisa são as senhas. Os pais devem ter acesso a todas as senhas e olhar frequentemente os grupos que o filho, menor de idade, participa. Use aplicativos de controle parental para te ajudar a controlar o tempo de uso, horário de desligar e limitar sites de acesso.

Sem dúvidas, um ponto importante é o tempo juntos. Os pais precisam ter tempo de qualidade com os filhos sem as telas. Tenham no mínimo uma refeição juntos ao dia e, uma vez por semana, façam atividades em família. Esses momentos precisam ser intencionais. Por isso, crie espaço para um tempo para ouvir o coração e preste atenção na linguagem não verbal que o corpo do seu filho transmite.

Além disso, evite filmes e de preferência aos jogos de tabuleiro, atividades ao ar livre ou outras situações que seja necessário que vocês se expressem, falem e interajam uns com os outros, mesmo que isso cause algum atrito entre os membros da família. Esse tempo é fundamental para trabalhar a frustração e o tempo de espera, habilidades primárias que têm sido esquecidas nessa geração que não pode ser contrariada e quer tudo imediatamente na mão.

Como os pais têm muitas atividades para fazer, uma sugestão é incluir o filho nessas atividades do dia-a-dia, como lavar o carro, fazer comida e arrumar a casa.

Por exemplo, recentemente precisei resolver um assunto no cartório e fiz questão de levar meus filhos para aprenderem sobre aquele local, como funciona, etc. Acredite: eles precisarão saber fazer essas atividades básicas, afinal, esperamos que cresçam saudáveis, se casem e formem a família deles um dia.

Última e mais importante dica: ensine seus filhos sobre o Reino de Deus, pois de nada adiantará serem bem-sucedidos nesse tempo tão curto aqui na terra, se não tiverem seus nomes escritos no Livro da Vida. Quanto mais cedo seus filhos conhecerem verdadeiramente o Senhor, mais protegidos eles estarão, pois o amor deles por Deus os livrará de muitas situações perigosas e os farão se sentir amados e terão convicção da identidade e de seus propósitos.

Por isso, não deixe as telas roubarem o tempo de mesa, conversas e devocionais da sua casa. Seja intencional em tudo que você fizer. Acredite, o tempo é curto! 18 anos passam voando!

Luciana G. Nabuth Cintra

Médica Pediatra, autora do livro: “Guia divertido para crianças felizes”. Instagram: @dra.luciananabuth.pediatria

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